Numa Noite Qualquer
Desceu as escadas em sobressalto. Acordara com o som de uma janela a partir-se. Pelo menos, assim parecia. Assaltaram a casa, pensou. Estava tudo em silêncio e a escuridão ocupava cada espaço perdido da casa. Espreitou e nada, nem ninguém viu. Acendeu as luzes. Espreitou, de novo, e nada. Encheu-se de coragem e deambulou pelo rés-do-chão. Não havia nada partido, nenhuma janela, e tudo parecia intacto e imaculado. Mas, afinal, o que a teria acordado? Quem som se fizera ouvir? Talvez, tivesse sonhado. Resolveu esquecer o assunto, respirou fundo, acalmou-se e subiu. Deitou-se e adormeceu. Numa noite qualquer, tudo seria diferente. Aquele cenário mudaria, as personagens encarnariam uma outra vivência, a história seria alterada. Os acontecimentos seriam simplificados e as alternâncias inconsequentes do decorrer da acção, fariam esquecer uma escrita deslavada e insonsa. O tributo espartano à prosa personificada, enquadra-se numa mística popular que resolve desvendar mistérios de forma tosca, desenvolvendo uma conturbada implosão de sentimentos mistos que descambam em envolvências mitrais ausentes. Numa noite qualquer, tudo correria bem. Numa noite qualquer, tudo seria pacífico. Numa noite qualquer, o vento levaria as memórias fechadas de um evento sonhado ou mal amado.