Nova Emergência - Dias 16 a 23 - As Rotinas Fechadas
(Breve história de um mundo quadrado, mudado e mutável. Ou não. Só palavreado articulado sem nexo realizável…) A incansável resiliência que aperta o coração faz o tempo passar condicionado pelo contexto surreal que nos separa de uma normalidade dificilmente reconhecível e vivida tão estranha e intensamente. As semanas vão também passando, os dias encurtando e as horas lentamente arrastando os pensamentos e qualquer outra coisa de mais abstracto que se vá construindo na mente que vagueia agora por terrenos insondáveis e incompreensíveis. Ou não. A clarividência de alguns e o alheamento relativamente ao desnorte de outros em seu redor potencia a dúvida legítima: estaremos a viver no mesmo universo? Neste mundo do universo real, as vacinas andam a ser prometidas há muito tempo, os planos de vacinação são milimetricamente estudados (sem vacinas), as eleições americanas continuam a ser notícia, o clima continua também e sempre a ser notícia (porque tem vindo a piorar a relação com a humanidade), o Irão volta a despertar, Maradona entregou-se ou foi entregue ao Criador, o Orçamento de Estado foi aprovado (por pouco), a transferência de fundos para o Novo Banco não o foi (e a confusão instalou-se), o congresso do PCP aconteceu mesmo, os internamentos covídicos continuam a aumentar, o recolher obrigatório a vigorar, as medidas restritivas a confinar, greves são agendadas e estamos quase todos com a vida, que era mais ou menos normal, de pernas para o ar. No mundo do universo paralelo todos se riem de nós, porque continuamos numa estúpida demanda, numa missão impossível, para salvar a Economia Antiga, decadente e ultrapassada, determinando já não casuisticamente, mas sim de forma muito resolutiva e conclusiva as sucessivas vagas covídicas que aí vêm. Mas, chegarão elas naturalmente, ou serão apenas o resultado lógico das políticas condicionadas e condicionadoras que vão definindo quais as vagas que podem surgir, quando e em que moldes? Ainda ninguém se convenceu de que precisamos de uma Economia Nova, renovada e inovadora, criativa, equilibrada e mais justa, de uma nova abordagem económica, de novos modelos económicos e de uma mudança radical, especialmente no que se compadece com hábitos de consumo desenfreado e descontrolado. Ou não. Cada geração desenvolve uma consciência muito própria e individualista, limitada pelo seu calendário e agenda existencial, e o ideal de equilíbrio e perfeição que se tenta constantemente passar às gerações futuras não passa disso mesmo, na grande maioria das vezes. O ideal perfeito, as ideias conciliadoras e aglutinadoras, o bem que vence o mal, fazer mais e melhor, promover a sustentabilidade e a responsabilidade social são muitas vezes apenas miragens num horizonte bem longínquo. Assim, os ciclos económicos acabam sempre por se renovar, numa cadência irritantemente quase sincronizada que se traduz em consequência perfeitamente expectável e nada surpreendente, ou seja, as rotinas regressam quase sempre, mais cedo ou mais tarde. E, por isso mesmo, são fechadas. Imutáveis. Estanques. Ou não. A afectação covídica nada de novo trouxe nesse âmbito. Infelizmente, continua a ser muito difícil poder esperar ou sonhar com a mudança da condição humana. Ninguém a quer, em boa verdade, porque se a quisessem fervorosamente, muita coisa já teria sido mudada, e falamos de conceptualização verdadeiramente estruturante e globalizante. Na tomada de decisão dos nossos líderes, apenas podemos contar com o seu bom senso e a sua ponderação, porque todas as decisões tomadas nos afectam e afectarão, durante aquele que é o nosso calendário e agenda existencial, e no mundo do nosso universo real.