Escritos de Era Bélica - Dia 3 - Mudança e Sobrevivência
(Somos as partes do todo. Somos o todo de cada parte. Somos a parte que parte. Somos a viragem, a mudança. Somos a viagem. Somos sempre, mesmo sem sermos. Somos o que não somos. Demasiadas vezes.) A reflexão acontece quando o sol regressa às nossas vidas, assim como o frio. A sombra, talvez se afaste assim, permitindo aquele breve suspiro que aspira a liberdade com causa. Ou sem ela. O que a liberdade nos traz é um sorriso sincero, ainda que temporário. O mundo que anda às voltas consigo próprio, faz-nos também girar sem rumo definido, sem trilho alcançado, sem caminho fácil, levando-nos a mais uma das múltiplas encruzilhadas que se entrosam com cada um de nós e com o todo, invariavelmente, todos os dias. A mudança boa que se espera acontece, mas, quase sempre, a outros dos quais ouvimos falar. Só temos as notícias, nunca os vemos realmente, a esses outros. Sabemos, ou imaginamos, que existam, mas não são visíveis. A sua invisibilidade é um manto mágico na noite e no dia. Sobrevivemos, pois, mesmo sem sermos abençoados, ou mesmo quando a fé nos abandona. E a fé e a bênção não são as religiosas. Exprimem em pensamento apenas aquilo em que meros mortais vão tentando acreditar, algo de bom que talvez exista mesmo e que possa motivar positivamente o espírito e a mente, independentemente da forma que assuma ou como seja fantasiado. As convulsões recorrentes que apartam os mundos dentro do mundo são espelhos de almas que gritam, num pedido de socorro tantas vezes incompreendido, manipulado ou distorcido. Se as realidades fossem lineares e as pessoas não tão belas na sua complexidade imaterial, talvez tudo se reduzisse verdadeiramente a algo mais simples, ao amor puro, à compaixão sentida e à benevolência existencial. Continuamos a ser partes. Partes singulares e únicas. Continuamos a pensar e a conhecer e a tentar saber mais e melhor. As guerras que vão continuando no mundo, na sua universalidade global, porque nos tocam sempre, directa ou indirectamente, transparecem a humana causa da continuidade, da sobrevivência. Cada uma, à sua maneira, reflete a tal tentativa de sobreviver como uma parte de um grande todo. Uns terão mais sucesso do que outros. Parece, no entanto, que estas partes que constituem o todo se esquecem, na grande maioria das vezes, umas das outras e concentram-se em si próprias com o intuito da sobrevivência individual, ou contida apenas na sua esfera, na sua bolha. Muitas vezes, a experiência demonstra que o conjunto unido produzirá um resultado propensamente mais benéfico na generalidade. O difícil é conjugar esforços e reunir consensos. A diversidade de pensamento é crucial para evoluir, mas há que ser trabalhada para se traduzir em acção proveitosa e consolidada. Mudança e sobrevivência, no conturbado plano de sapiência em constante construção, é desígnio aspiracional diário, que impulsiona e estimula a procura pela articulação entre novo e velho saber, porque o passado importa e determina, o presente acontece e é acção, o futuro é consequência e, espera-se, melhoria e boa surpresa. Este discurso, que se vai desviando e ajustando através da sinuosidade das linhas decisórias existenciais, é inconsequente, mas regista os estados de espírito, as dimensões paralelas e a universalidade da imaginação, que vai recriando realidades virtuais abstractas, seguras e fechadas. A era bélica das políticas confusas e profusas é a verdade para os sentidos, e a capacidade de adaptação a esta era, bem como a toda a tecnologia que com ela chega constantemente, é o factor crítico de sucesso que determinará a sobrevivência e que permitirá aspirar a alguma boa mudança. Ou não.