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A Esquina do Desencontro

Histórias de Desencontros Ficcionais (ou Não) na Esquina da Vida

Escritos da Era Bélica - Dia 11 - Apenas Retalhos

09.06.25 | Cuca Margoux

(O dizer desdito que tudo dita, no meandro invisível da canalização condicionada da mente fechada, é o ponto desviado para o rumor, já não mais adiado, de que o mundo acabou de reiniciar, numa lógica incompleta, que não se quer, e não se espera, de novo, mais aberta. O pensamento crítico perdeu-se e o conhecimento apagou-se. Já nada sabemos, já nada podemos. Somos escravos digitais, tecnologicamente modificados e biologicamente estragados. Andamos, mas não nos movemos. Olhamos, mas não vemos. Ouvimos, mas não escutamos. Sabemos, mas não fazemos. Aprendemos, mas não conhecemos. Pensamos, mas não agimos. Biologicamente estragados. Assim, estamos. Ou não.) Os retalhos decompostos no caos da composição humana, configuram a dose diária de incrédulos anúncios, notícias, medidas, lógicas e afins que nos vão acontecendo. Vemos e escutamos, mas não queremos acreditar, porque a lógica da realidade sofreu tal mutação, que se tornou irreconhecível. O que é agora, já não é no microssegundo imediato. O que dizer do que vivemos? Dispersos numa moralidade e numa ética desviadas, somos reconduzidos e recondicionados pelas malícias e artifícios mundanos que se escondem na subtileza do ensinamento doutrinado. Escuta-se o que se quer escutar, vê-se o que se quer ver. Tão somente, e apenas. Queremos desesperadamente acreditar num mundo melhor. Mas, o que é um mundo melhor? Para mim, é uma coisa. Para ti, será outra. Para os outros, se calhar, nada será. Os destinos fatídicos se definem na labuta diária contra a contradição, contraproducente na maquinação, cada vez mais ousada, movida pela inteligência artificializada e pelas plataformas feitas de equívocos controlados. As coisas vão acontecendo, o mundo vai mudando e nada podemos contra os desígnios maiores de algo bem maior que nós. A mão invisível vai mexendo e remexendo. Aqui e ali. Por todo o lado. Em tudo. Guerra constante. Caos constante. Drama constante. Dor constante. Morte constante. Retrocesso constante. Política brilhante. Poder dominante. Riso forçado no desespero de um qualquer olhar perscrutante. Sim, o positivismo parece ter acabado e o determinismo ter sido consagrado, num absolutismo irrevogável que tudo passará a ditar. O ódio crescente, a incompreensão presente, o contexto manipulado, o relógio não mais acertado, são faces de uma nova moeda. Uma moeda quadrada e nada reluzente. As pequenas boas coisas que parecem querer brotar do eterno ciclo viciado da consequência consequente, são insignificâncias e carecem de expansão generalizada, que todos alcance na sua benevolência, compaixão e boa índole. Atirar todos os retalhos para o marasmo da mente que se esquece. Que belo pensamento. O esquecimento tudo protege. O esquecimento tudo permite. O desmentido da alma com poder, tudo eleva e releva. Conquistar o mundo. Que triste pensar. Partilhar o mundo, que verdade inalcançável. Ser a bondade e a empatia, a beleza e a pureza, a harmonia e o equilíbrio, que palavras entusiasmantes, que dizeres maravilhosos, que realidades tão distantes. Apenas retalhos, de tempos, espaços, épocas, viveres, experiências, avanços e retrocessos, de mudança e de procura, de busca pelo efémero, de sonho eterno. O viver é incerto. A vida é imprevista. O propósito quase nunca é descoberto e as coisas que acontecem são sempre passado presente e presente futuro. O ciclo irá renovar-se e repetir-se, sempre sem fim. Assim, o é. Assim, o foi. Assim, o será, nestes pequenos, grandes, e, apenas retalhos. Uma esperança lá vem, de tempos a tempos, para tudo recompor, para manter a chama do coração viva, quente. Não dura muito, mas dá alento. Apenas retalhos. Tantos e tão poucos. Tantos e tão confusos. Tantos e tão incompreendidos. Tantos e tão incontroláveis. Mas, são mesmo, apenas retalhos. Ou não.